Agente Duplo (2020), de Maite Alberdi
Agente Duplo é um ótimo exemplo de como um documentário não é um mero registro da realidade. Inicialmente, a diretora Maite Alberdi utiliza da premissa da espionagem para desenvolver a narrativa, e a forma do filme serve muito bem à essa temática. Rapidamente percebemos como todo aquele aparato de câmeras escondidas do protagonista é apenas um pretexto para convencê-lo de sua missão secreta (visto que, ao longo de todo o filme, temos diferentes câmeras e enquadramentos profissionais sendo utilizados). Contudo, a premissa é mesmo assim muito bem construída através de uma montagem que encurta planos e uma trilha sonora característica desse tom peculiar e levemente cômico de se ter um idoso de 83 anos em um trabalho de espionagem.
A virada de tom ocorre gradualmente. Pouco a pouco, Alberdi vai abrindo mão desses aspectos iniciais e deixando o drama se desenvolver pelas relações entre os idosos da casa. É como se a gradual ambientação do protagonista ao novo espaço dialogasse paulatinamente com o menor controle da cineasta a respeito da narrativa. No lugar da peculiaridade investigativa, a sensibilidade a respeito das histórias humanas. No lugar do ritmo rápido e altamente pontuado pela trilha sonora, mais planos fixos e diálogos frontais.
Ora, é evidente que em qualquer documentário não há controle total por parte da cineasta a respeito do que acontece. Os idosos do filme agem espontaneamente, sem falas ensaiadas, e a câmera precisa acompanhar tudo isso de alguma maneira. E é justamente nessa maneira em que os grandes documentários nascem. Ao invés de apenas passar uma mensagem de forma didática e ilustrativa, o que o filme faz é deixar sua temática se aflorar na medida em que as relações são construídas.
Não é apenas um registro jornalístico da vida desses idosos.
É arte.
É cinema.