A Batalha de Argel (1966), de Gillo Pontecorvo
A impressão inicial que o filme deixa, com a cena pós-tortura, é a de que o foco narrativo será maior nos atos repressivos das revoltas, com um olhar mais íntimo para o sofrimento daquelas pessoas. Na verdade, A Batalha de Argel é um filme que assume certo distanciamento dramático dos acontecimentos, tanto nas ações de guerrilha quanto na repressão militar. O diretor Gillo Pontecorvo busca uma minuciosidade com relação às ações de ambos os lados.

A dinâmica dos rebeldes na estratégia de seus atos é muito bem articulada, há uma tensão presente em momentos pontuais que é desenvolvida por diversos aspectos, em especial a trilha sonora marcante. Já no lado militar, o filme foca especialmente na figura do capitão, mas não chega, como Padilha acaba fazendo em Tropa de Elite, a buscar um engrandecimento desse personagem. Suas ações, assim como as do lado rebelde, são retratadas como necessárias dentro de seu dispositivo ideológico. Não há questionamentos morais claros, a direção de Pontecorvo não vibra e nem estigmatiza muito nenhum dos lados.
O modo como se desenvolvem os acontecimentos é o que acaba sendo o grande foco da narrativa. Em alguns momentos, o filme até possui um aspecto mais documental, com câmera na mão no meio das multidões. Mesmo com atores profissionais e movimentações ensaiadas, parece realmente que nesses momentos as ações vão se desenrolando e a câmera tenta de alguma forma acompanhar tudo. Entretanto, não é como se o filme todo tentasse sintetizar uma ideia de “cinema verdade” que não interfere nos acontecimentos. Existe um cuidado muito especial na construção da tensão em momentos específicos.

Muita coisa feita aqui pode ter servido de inspiração para o cinema de máfia de Scorsese e Tarantino, no sentido de dar mais atenção à minuciosidade dos atos em si do que à uma dramatização mais intimista dos personagens envolvidos. Com uma voz em off que entra para contextualizar o que será apresentado, as estratégias do conflito são construídas por meio de uma montagem rápida que fragmenta os espaços e imprime elipses à narrativa, além de uma decupagem que salienta os conflitos pelos espaços em off, por aquilo que não é visto, mas é temido. A Batalha de Argel é um filme de procedimentos, de liturgias de sobrevivência.